5.4.13

Palavras a uma mulher

(Por Natássia Garcia, Escrita em: 26/08/2008)


 
A imagem à força de um sopro.

Hálito abrupto de vento trai a esperança.

Se permitir sentir, contudo, a corrente dele é o próprio corpo.

No olho do furacão só podemos confiar na desordem. Mas afinal, não seria este o melhor lugar para lançarmos nossos órgãos no tempo-espaço e num giro violento debruçarmos sobre a freqüência da liberdade?

Na vida,

O próprio crescimento parece depender

da virilidade;

da objetivação;

do risco que objetos duros trazem e como se tratam as rupturas.

O aprendizado passa pelo “livro dos prazeres” provocando cortes de profundo amor e deslocamentos das certezas em dúvidas corrosivas... Deixar a carne trêmula, além das marcas de apropriação e desempenho dos dentes nos seios. Em si a dor.

Em conforto: permanecem atentos os encontros de almas nos olhos marejados d’água.

Em confronto: a derrisão.

Ninguém é tão duro que não se quebre... Ninguém é tão frágil que não se fortaleça.

Porque, enfim, há poesia.

La Mariposa sem ilusões

 (Por Natássia Garcia, Escrita em julho de 2013)

I

 

No lugar do frio

A chama ascendente ao sorriso!

Nem o sol apontara ainda,

Mas a alegria compunha nela uma fornalha acesa.

 

Da janela

Olhara com curiosidade os olhos maduros profundos

E observara esquiva os nãos que vêm junto ao desejo.

Subjacente à película alva, uma fome de experiência espiritual.

Ele, o desconhecido de antes, nem sequer sabia pronunciar o nome dela.

Para ela, então, o homem era um homem, um momento presente e só.

Não poderia suportar a possibilidade de um futuro que não saberia...

Brev(idade) – o tempo foi superado pelo acontecimento o qual ela não resistira.

 

II

 

Leve leve leve

Prazer de tal dança.

Meu corpo em dois na tua presença

Teu corpo em mim como uma benção.

No receio de ser sagrada,

Com anseio de ser profana,

Enrolei-me em teus dedos,

Mergulhei em tua cama.

E depois nem sei quem sou na medida do amor.

 

 

Pois a pele da pelve não impede,

Impele,

Pêssego em meio às pernas

Abrindo doce e úmida flor para atravessar o deserto

Bebo tua saliva pelo tocar das línguas

Quando tu me invades, quando tu dá-me teus beijos

Vejo minh’alma dançando como peixes n’água

Espiralada

Sinto o cheiro do tempo impregnando minhas narinas quando tu ainda não foste.

 

Gosto de ti na minha boca,

nas minhas roupas,

No meu corpo todo –

Um sopro de respiração quente,

Um hálito do teu som rouco,

Um tom de teus humores irônicos,

Quero-te.

 

 

– Silhueta de Vênus, grande, grande mesmo! Eu escuto.

– Largas ancas, grossas coxas e alma. Eu retruco.

Calma! Eu reluto.

 

Intermitente

Lembrança das sardas, da nuca, dos cabelos macios brancos, da barba arisca, dos lábios quentes em meu ventre, do tronco nu do anjo brando penetrante.

 

Penitente

– Como estou? perguntei

– Vulnerável, respondi.

 

Agora o orgasmo reverbera como seu nome ecoa

                                                                               estou aqui

                                                                                                aqui

                                                                                                        ai

 

III

 

As pálpebras cerraram,

Os cílios tocaram meus sonhos com a leveza de asas de mariposa.

Órgãos leves

Leve leve leve

Assim me senti depois de levá-lo para lá quando dormi no teu peito depois de arder...

 

Se só, não sei.

De minha parte, inteireza.

Transpassaram as pernas e os braços nos lençóis com leveza.

E o tempo passou e passa e com ele os laços como ficam?

 

Amigo amante querido,

Tomo a liberdade de levar teu cheiro comigo.

Sem ilusões.

 
Foto: Natássia Garcia

4.4.13


ESCRITOS PARA A PEÇA "A BRISA E O AQUÁRIO" - FRAGMENTO "VOMITANDO UM SAPO"

(Por Natássia Garcia)

Um sapo. Pensei ter atropelado um sapo. Fato. Não podes me acometer com tamanha audácia. Podes sim me partir e curar o mal que me trouxeste. Não tem tamanho nem rosto nem fera, mas tem grossura e sabor que me espera. Se tiveres a mim te perdes nas entranças do galope, a marcha te assusta e te arranha o poder, a única chance que tens de amar e arrebatas o tempo brincando de deus, solfejando audácias de quem nada sabe sobre o amor. Fazes. Ocultas sem saber o que te guarda e pedes socorro sem expor a ferida. Teu malgrado é o agouro do absurdo da calamidade apoderada infame. Outra língua outra sorte outro encanto. De nada serve tuas doses homeopáticas de amor, se o amor que distribuíste te sufoca, te engole, te tolhe pela falta de coragem. Selvagem texto descobrindo o engodo a chaga e a malícia do vento que trouxe o desamor. Foges. Vai! E carregas contigo a filha pródiga da preguiça de amar. Vai! Cobre as pernas e esconde a vergonha do pranto de um homem louco pendurado em penas. Sai, sai e não volta. E se voltares fique com minha... Sai, sai, sai, quero esconder os olhos, cobrir esta imagem de ti. Se um dia quiser pecado te chamo, mas se quiser amor... tu não mais estarás. Suma, suma, em suma é isso. É o trote e o galope alado da visão turva. Curva e me faz morrer um pouco mais, um pouco. Chora meus olhos d’água a aguda poça de sal. Não arrisca, não trisca, mas sangra meu torço e chupa, chupa minhas artérias. Calunia meu gozo e come minha carcaça estranha, abrupta, eloquente. Não haverá mais nada absolutamente nada, nenhum vestígio de dor ou tristeza quando me procurares. Será mentira toda a verdade que consumiste, e que pelo tempo eu permiti viver e fazer qualquer coisa para viver esta tolice. Parte. Pois se um dia eu partir, sinto que ficarei. Não terei forças para dizer não. Abriu?! Mas se sair não voltarei como estou agora, não conseguirei mergulhar neste tempo de água, míngua, teto, ferro, brasa. Se sair, acabará. O vidro, o quadro gélido do aquário. A abundância da dor. O véu que circunda tem amargura da chuva, ácida, pobre, lenta. Escorre as gotículas e eu escrevo qualquer coisa que me lembre amor. O afeto de Vênus e a oportunidade de ser um pouco mais cálida.

Imagem: http://obviousmag.org/archives/2012/04/cecilia_paredes_arte_a_flor_da_pele.html